sexta-feira, 6 de abril de 2007

A última etapa (1)

Quando se fala em Direitos, Liberdades e Garantias, a Constituição da República Portuguesa é, segundo se diz, uma das mais avançadas da Europa. Em teoria, claro. A vivência do dia-a-dia mostra-nos uma realidade amarga, bem diferente da que consta nos anais da nossa bem amada Lei Fundamental.

O cidadão comum, quando atinge a maturidade da meia-idade, aspira à tranquilidade e à segurança de um emprego estável, com alguma margem de progressão e de realização profissional. As preocupações centram-se então, na educação dos filhos, e no apoio e atenção, que por essa altura, já necessitam os seus progenitores.

A terceira idade é, por ironia e despropósito do Criador, a etapa mais difícil da nossa vida. Talvez a intenção seja a de não deixar saudades, muito menos, vontade de cá voltar.

Tudo seria bem melhor, se por esta altura não fossem subvertidos alguns dos principais direitos consagrados na dita Lei. Desde logo o acesso à saúde, independentemente das condições económicas e sociais de cada cidadão.

Vejamos este exemplo:

- Quando um idoso acumula problemas de saúde de vária ordem, e é obrigado a sair de sua casa, e da localidade onde reside, porque o seu médico de família o exclui, arbitrariamente, da sua lista de utentes, sem qualquer motivo plausível ou justificado;
- quando esse médico é a única alternativa de saúde na localidade;
- quando um idoso formaliza uma reclamação legítima, no livro apropriado, da conduta deste clínico;
- quando é apresentado um pedido de apoio generalizado a todas as instâncias do distrito, a quem cabe a protecção social e a defesa do utente na área da saúde;
- quando o eco que se ouve do outro lado é vago, impreciso, ou quase nulo… parece-me que a Constituição da República Portuguesa, e todos os mecanismos criados para a defesa do cidadão, na prática, não funcionam, tal como estão consagrados na lei.

Será que não é caso para nos inquietarmos seriamente, com a perspectiva de alguns de nós chegarmos à última etapa da vida e não pudermos, sequer, pedir uma simples declaração, da exclusiva competência do médico de família, por medo de represálias? E o que acontece a quem reclama? Pois é, meus amigos, nem queiram saber! A vida, nesta derradeira etapa, é bem mais complicada do que parece e do que a nossa lei, benevolamente prevê.

Esta história não se passa na nossa cidade. Felizmente por cá, ainda existem alternativas, desde logo, mais do que um único médico de família para toda a população. Mas é verdadeira e desenrola-se geograficamente bem perto de nós.

Uma boa Páscoa para todos.

Manuel Filipe Quintas